Nigella
Lawson foi notícia este mês em todos os tablóides e jornais sérios do Mundo,
não pela sua comida mas por ter sido vítima da agressão do seu milionário
marido. As imagens mostram nitidamente o marido a apertar-lhe o pescoço numa
esplanada pública e a Nigella a contorcer-se de medo ou de dor ou de
ambos. Toda a gente condenou a violência doméstica, muitos condenaram o marido
e alguns a Nigella por não ter " qualquer necessidade" de se sujeitar
aquela violência.
E foi na
questão da "necessidade" que eu ando a pensar desde essa
altura. A violência doméstica não está exclusivamente ligada à questão
material. Claro que ajuda a perpetuar a violência quando o membro agredido do
casal não tem meios de subsistência para sair de casa. Mas a violência
doméstica é um problema mais complexo, na minha opinião. A Nigella, como muitas
mulheres e homens, criou para si ( e vendeu essa imagem para os outros)
de uma vida familiar casual, às vezes chique, muito descontraída, onde entre
pratos e conversas se expressavam os mais bonitos sentimentos familiares de
unidade e de afectos. E nós, e a própria Nigella, compramos essa imagem de
harmonia familiar meia caótica mas tão romântica. E depois a sociedade ainda diz coisas incriveis como
" ele(a) é tão bom para ela(e)", ou " que sorte a dela(
e)".
A teia de
pequenas ilusões que criamos confunde-se tantas vezes com a realidade que
queremos transmitir. E de ilusão em ilusão, não conseguimos sair da imagem de
felicidade criada por nós e para nós. Se terá a Nigella ficado presa nessa
armadilha é coisa que eu não posso garantir. Mas, se nós mentimos a nós próprios com tanta
facilidade, como não mentir a uma sociedade que acredita em romances de amor
entre bolos perfeitos e decorações harmoniosas?
É mais
fácil suportar um estalo do que o fim de um romance, ouvi uma vez uma mulher a dizer como
justificação dos anos de violência doméstica a que se sujeitou. Mas há romance
entre estalos e ofensas? Esta é a minha questão.
Ouça,
a Nigella também saiu de casa, e a sua vida é parecida com a da Nigella,
então deite o bolo perfeito para o lixo e seja feliz. A vida é muito curta para
histórias de amor falsas e vidas de purpurina...
A violência destrói o que ela pretende defender: a dignidade
da vida, a liberdade do ser humano.
João Paulo II
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