domingo, 17 de março de 2013

Precisamos de falar sobre o Kevin.

Vi um filme que não me sai da cabeça," We need to talk about Kevin". Tradução portuguesa à letra: "Precisamos de falar sobre o Kevin". Não é minha intenção avaliar o filme nem o desempenho dos actores, que é extraordinário. O que eu pretendo é que todos nós debatemos este tema polémico: a possibilidade de os nossos filhos serem absolutamente horríveis e nós nos apercebermos e nada podermos fazer.
Quando se fala de parentalidade e de filhos, o discurso é sempre o mesmo: que é a melhor coisa do mundo, que ser mãe ou pai é uma felicidade sem fim, que as noites sem dormir valem a pena porque o sorriso dos filhos compensa tudo. Muito bem, discurso absorvido. Agora vamos falar sem máscaras e sem tabus.
E se não gostarmos dos nossos filhos? E se só tivemos filhos porque o marido ou a mulher quis? E se os nossos filhos nos odiarem? E se um deles violar o outro? E se houver incesto? E se o nosso filho for um violador? Um assassino? E se os nossos filhos forem mesmo uns monstros?
Será que podemos falar sobre isto sem tabus, nem frases feitas e sem apregoar a imensa felicidade que esta nossa sociedade nos impõe e nos esmaga?
O que fazer quando o nosso filho viola a vizinha? Continuamos a gostar dele da mesma maneira?
O que fazer quando o nosso filho é alguém que adora maltratar os outros? A quem recorremos para falar?
O que fazer quando o nosso filho mata alguém? Perdoamos ou viramos as costas?
E se eu não gostar do meu filho?
Gostava de uma conversa franca com alguém sobre estas questões e eu nem sequer sou mãe. Mas sempre me afligiram as verdades escondidas, sempre vi mães que preferem claramente um filho em detrimento de outro, sempre me apercebi de pais que têm dúvidas mas não têm ninguém com quem falar.
Tenho receio de não gostar de um filho meu. Isso faz de mim uma má pessoa ou uma pessoa consciente?
A nossa mania da felicidade está a deixar-me muito inquieta e infeliz. E percebo o medo de alguém que tem um filho que não é nada boa pessoa: com quem vai falar que não o condene pela educação, ou que diga que é só uma fase, ou que não lhe espete que os filhos precisam é de carinho e amor? Ninguém, não vai falar com ninguém.
A cultura da felicidade condena-nos ao isolamento e à artificialidade. Falar dos filhos sem ser com imensurável orgulho e felicidade está a calar-nos e a tornar tabu coisas de que deveríamos todos falar.
E no meio de tudo isto ninguém fala sobre o Kevin. E nós, como sociedade precisamos de começar a falar sobre o Kevin. Antes que seja tarde demais.

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